segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Anita no cinema

Se para lisboetas de gema, e desenraizados de longa data “Aquele querido mês de Agosto” não passa de um documentário ficcionado sobre bailaricos de província e musica pimba, qualquer pessoa que tenha vivido a intensidade de um mês de Agosto no interior do país reconhece neste filme todas as emoções dessa experiência condensadas em cerca de duas horas. Está tudo lá e eu não o saberia dizer de melhor forma. Não são só os bailes (que continuam a ser no contexto rural o espaço de exploração do interdito), mas também as paixões de verão, os pequenos grandes mitos rurais (há um Paulo Moleiro em cada aldeia), a liberdade e a disponibilidade, os visitantes sazonais que ampliam o ambiente de festa...
Embora haja quem insista em dividir o filme em duas partes (como se fizesse sentido ver a parte documental à espera que comece finalmente a “história”), na verdade os contornos entre ficção e realidade parecem-me sempre esbatidos, e isso só contribui para a magia: em Agosto tudo é possível e essa ideia é reforçada pelo non-sense, pela postura blaisé da equipa de filmagens que parece contagiada pelo espírito de férias, pelo amadorismo dos actores (e alguns nasceram para ser estrelas, como é o caso do homem do karaoke, que tem uma presença incrível),
Um filme é tanto melhor quanto mais nos faz rever os conceitos que vamos criando e “aquele querido...” fá-lo na perfeição: é incrível como o simples facto de se legendar uma música nos pode oferecer um novo olhar sobre ela.
Pelo domínio perfeito da estética do fragmento, pela montagem e pelo som irrepreensíveis, pela forma como souberam fazer magia usando a prata da casa, por terem lidado com o imprevisto com muita coragem, e porque é verdadeiramente raro encontrar uma tal frescura numa época em que tudo é injectado de acabamentos uniformizantes e de profissionalismo estéril, dou os parabéns a toda a equipa.
A aparência da facilidade é a arte dos mágicos e dos acrobatas e como se sabe não é nada fácil de dominar...

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